
“Somos um grupo que sempre cumpriu com as contas. Não deviamos ser uma empresa sacrificada na praça pública pela vingança de um pateta, e eu não devia passar por esta vergonha que estou a passar”, frisou o empresário Mário Ferreira, proprietário da empresa de cruzeiros Douro Azul, em entrevista à SIC nesta sexta-feira.
Um dos temas abordados foi o da investigação de que o grupo de Mário Ferreira está a ser alvo por ‘fraude fiscal qualificada’ e ‘branqueamento de capitais’ num processo associado à compra e venda do navio Atlântida.
Num caso que ficou conhecido como ‘Operação Atlântida’, o proprietário da empresa de cruzeiros (e também dono da Media Capital, empresa proprietária da TVI) é suspeito de ter montado um esquema de fuga ao Fisco na compra e venda do navio Atlântida, processo que decorreu entre 2014 e 2016 e que, segundo as Finanças, gerou uma dívida de cerca de seis milhões de euros em impostos não pagos. Este é o segundo processo que o empresário enfrenta sobre este caso, tendo o primeiro sido arquivado em 2016.
Mário Ferreira disse que tem havido “mentiras redondas” acerca deste processo e que “foram empolados custos fictícios”.
“Os gestores dos estaleiros de Viana é que deviam estar a ser investigados”, diz Mário Ferreira
O navio Atlântida foi comprado em setembro de 2014 pela Mystic Cruises, detida pelo dono da Douro Azul, aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo por 8,75 milhões de euros, e vendido em 2015 por 17,3 milhões de euros a uma empresa norueguesa. A venda foi feita por uma empresa de Mário Ferreira sediada numa sociedade ‘offshore’ em Malta.
Na venda do Atlântida, pelo dobro do valor a que tinha sido comprado, apurou-se que o proprietário da Douro Azul acabou por comprar o navio a si próprio – uma vez que, após comprar o Atlântida, criou duas firmas offshore em Malta para manter os lucros obtidos pela venda do navio (a International Trade Winds Holding, Ltd (ITWH), e, a International Trade Winds, Ltd (ITW), subsidiária detida a 100% pela primeira, segundo investigação do Expresso no âmbito do processo ‘Malta Files’.
O detalhe é que Mário Ferreira terá vendido primeiro o navio Atlântida à sua nova empresa que criou no ‘offshore’ em Malta, a ITW, por 11,5 milhões de euros, e só depois o vendeu à Hurtigruten, empresa de cruzeiros norueguesa, por 17,3 milhões de euros.
Mário Ferreira clarificou, na entrevista à SIC, que comprou o navio em 2014 aos estaleiros de Viana por 8 milhões, abaixo do seu custo de construção, de cerca de 40 milhões de euros, porque o navio estava em más condições e quase para sucata quando o comprou – “tinha toneladas de marisco agarrado, não estava operacional” – e nem sequer tinha certificação.
O empresário alegou que teve de fazer investimentos na reabilitação e certificação do Atlântida, razão porque abriu uma empresa em Malta, elevando o seu valor a 11,5 milhões de euros e permitindo a sua venda mais tarde ao grupo norueguês por 17,3 milhões, não se tratando por isso de vender o navio a si próprio. Segundo Mário Ferreira, as mais-valias com a venda do navio foram cerca de cinco milhões de euros.
Recorde-se que o navio Atlântida tinha sido construído nos estaleiros de Viana para o Governo dos Açores, que o recusou. Mário Ferreira enfatizou “a grande incompetência dos gestores que lá estavam” (nos estaleiros de Viana). “Esta gestão pública foi um desastre, eles é que deviam estar a ser investigados”, sustentou.
“Levaram todos os documentos que já tinham levado em 2016”
Esta quarta-feira. todas as empresas de Mário Ferreira foram alvo de buscas, num processo movido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e a Autoridade Tributária (AT). As buscas incidiram na sede da Douro Azul no Porto, estendendo-se também a outras empresas detidas pelo empresário em ‘offshores’ no Funchal e em Malta.
“Levaram todos os documentos que já tinham levado no passado, em 2016”, salientou Mário Ferreira, frisando não ter receio das investigações. “Está tudo clarinho, não há dúvidas”.
Mário Ferreira foi constituído arguido esta quinta-feira no âmbito do processo ‘Operação Atlântida’, o que ele próprio solicitou ao Ministério Público para um desfecho mais rápido do processo, assegurando “total e imediata disponibilidade com a Justiça” para esclarecer os factos.