
A agência de notação financeira Fitch decidiu manter a classificação da dívida portuguesa em BBB (dois níveis acima de lixo), mas melhorou o “outlook” (perspetiva para a evolução da qualidade do crédito) – que passou de estável para positivo.
A Fitch justifica a sua decisão com o bom desempenho orçamental de Portugal, a estabilidade política – que sustenta a redução da dívida –, e os fundos comunitários ‘Next Generation EU’ [a iniciativa europeia criada para responder às consequências da pandemia de covid-19].
“A crise orçamental decorrente da pandemia foi menos severa do que na maioria dos seus pares europeus. Além disso, o rácio da dívida face ao PIB, apesar de ser alto, está numa firme trajetória de descida. Uma retoma económica mais robusta do que o esperado e alguma contenção do Governo nos gastos durante a resposta pandémica levaram a melhores retornos orçamentais face à média da Zona Euro”, diz o relatório divulgado esta sexta-feira à noite.
A agência refere também que o défice orçamental do país atingiu 2,8% do PIB em 2021 (contra 5,8% em 2020), tendo por isso sido “significativamente melhor do que a estimativa do Governo de 4,3% do PIB e inferior ao défice médio na Zona Euro”.
“O défice orçamental de Portugal também está abaixo da atual média dos seus pares que têm um rating BBB – e que é de 4,4%”, aponta.
Ministério das Finanças vê reforçada “credibilidade financeira de Portugal”
O Ministério das Finanças já reagiu, congratulando-se com a decisão. ” Depois da DBRS, esta é a segunda agência a melhorar este ano a perspetiva para a dívida do país, o que acontece num contexto de elevada incerteza na economia global, resultante, em parte, da invasão russa da Ucrânia”, diz o comunicado do Ministério tutelado por Fernando Medina.
“De acordo com a Fitch, a decisão reflete a capacidade de recuperação que a economia nacional tem demonstrado, superando as expectativas, a gestão eficiente da despesa pública e, em particular, a trajetória de progressiva redução do peso da dívida pública no produto. A agência de notação sublinha ainda a vantagem de o país beneficiar de um quadro de forte estabilidade política”, sublinha.
A decisão da Fitch “reforça a credibilidade financeira de Portugal e confirma a importância de continuarmos a implementar políticas que combinem a recuperação da economia, a sustentabilidade das contas públicas e uma estratégia de redução da dívida pública”, diz Fernando Medina no mesmo comunicado.
“Esta melhoria decidida pela Fitch permite enfrentar a incerteza internacional e eventuais alterações de política monetária com confiança acrescida, suportada na política do Governo para defender as condições de financiamento das empresas, das famílias e da República”, acrescenta o ministro das Finanças.
Maioria do PS cria pano de fundo mais estável
A Fitch refere ainda, no seu relatório, que a maioria absoluta do Partido Socialista no Parlamento, na sequência das eleições legislativas de janeiro, “cria um pano de fundo mais estável para a tomada de decisões políticas e coloca o Governo do primeiro-ministro António Costa numa posição sólida para implementar a sua agenda orçamental e económica”.
Relativamente a riscos para o crescimento, a agência salienta que, num cenário de corte do fornecimento de gás da Rússia para a União Europeia (que não é o cenário de base para a Fitch), “estimamos que Portugal possa ser relativamente menos afetado do que outros países da União Europeia pelo impacto direto de uma crise de fornecimento de energia, atendendo à sua baixa dependência de energia russa”.
A Fitch recorda os dados do Eurostat, que dizem que a Rússia representou 4,9% das necessidades energéticas importadas por Portugal em 2020, ficando assim abaixo da média de 24,4% da UE.
“No entanto, a resultante subida global dos preços da energia, nesse tal cenário, provocaria uma forte mossa ao crescimento de Portugal”, adverte.
A agência refere ainda as metas orçamentais propostas para 2022, que apontam para um défice de 1,9% do PIB. E diz que, apesar de se prever que o rádio da dívida pública de Portugal continue a descer face ao PIB, ao estar nos 127,4% (em 2021) continua a ser o terceiro maior da Europa e substancialmente acima do atual rácio médio dos seus pares na categoria BBB (que é de 55,3%).
E apesar de o acordo político entre a Comissão Europeia, Portugal e Espanha – no sentido de limitar o preço médio do gás natural na produção de eletricidade – poder aliviar o setor e os consumidores, a Fitch frisa que o volume relativamente elevado das importações de Portugal em matéria de produtos alimentares e bens industriais não energéticos deixam a inflação no país vulnerável a perturbações da oferta a nível mundial e a subidas nos preços das matérias-primas.
Banca resiliente
A Fitch refere ainda a resiliência da banca, lembrando que no passado mês de março reviu o “outlook” do contexto operacional do setor bancário, de estável para positivo, “refletindo a retoma económica de Portugal e a inexistência de encargos significativos com o crédito malparado desde que as moratórias expiraram, em setembro de 2021”.
“Apesar do choque pandémico, as métricas de capital do setor melhoraram em 2021. (…) Os bancos portugueses têm uma exposição muito limitada aos seus congéneres russos (…), pelo que os riscos diretos das sanções contra Moscovo são baixos”.
No entanto, sublinha, “os efeitos de segunda ordem dos riscos de um menor crescimento em Portugal e na Zona Euro, de um aumento da inflação e de uma deterioração do sentimento económico poderão pesar nas perspetivas de rendibilidade da banca em 2022 e 2023”, alerta, apontando que esses efeitos negativos poderão ser mitigados por um contexto de taxas de juro mais altas – que se espera que beneficie a rendibilidade dos bancos.
(notícia atualizada pela última vez às 22:56)